Fundo Amazônia é o único recurso no Brasil para custeio de  combate ao desmatamento, diz ISA

Fundo Amazônia é o único recurso no Brasil para custeio de  combate ao desmatamento, diz ISA

Desmatamento no norte de Mato Grosso. Fiscalização de órgãos federais é mantida com dinheiro do Fundo Amazônia. Foto: Ibama.

Oslo, Noruega – Dez anos após a criação do Fundo Amazônia, o Brasil continua órfão de uma estratégia de uso sustentável para as suas florestas. Esta crítica foi feita a ((o))eco pela coordenadora do Instituto Socioambiental (ISA), Adriana Ramos, durante o Fórum de Florestas Tropicais, que ocorreu na última semana de junho, nos dias 27 e 28.

Realizado em Oslo, esta é a principal conferencia global sobre florestas tropicais promovido pelo Ministério de Clima e Ambiente da Noruega e pela sua agência de cooperação para o desenvolvimento (Norad). O evento coincidiu com o início das comemorações dos dez anos de criação do Fundo Amazônia, que capta doações internacionais para investimentos de ações de Redução de Emissões Provenientes do Desmatamento e da Degradação Florestal (REDD+).

Apesar de o desmatamento na Amazônia haver registrado uma redução de 75% entre 2004 e 2017, a falta de uma estratégia ampla para o uso sustentável da Amazônia que beneficie as populações que vivem na floresta e, ao mesmo tempo, promova a conservação e evite o corte de árvores foi uma das críticas feita por Ramos em Oslo. Ela resume a insatisfação de muitos que trabalham na área ambiental.

“O fundo gasta muito dinheiro com [ações do] governo, algo que deveria ser financiado pelo poder público. O governo não está conseguindo implementar políticas consistentes com o plano de prevenção e combate ao desmatamento, não tem sequer recurso para fazer isso. Hoje, até a fiscalização do Ibama é financiada pelo Fundo Amazônia. Não dá para achar que está tudo bem”, criticou a coordenadora do ISA.

Conferencia global sobre florestas tropicais. Crédito: Cortesia Norad.

Segundo  Ramos, o Fundo Amazônia é atualmente o único recurso existente para ações de combate ao desmatamento e promoção do uso sustentável da floresta no país. “Se ele não existisse, estaríamos bem mal”, disse ao destacar que tem se observado maior pressão sobre as áreas protegidas e terras indígenas. “Considerando que as políticas [de criação de áreas protegidas e demarcação de TI] foram interrompidas, o que o Fundo consegue fazer hoje é ótimo tendo em vista esse cenário”, ressaltou.

Herança de Bali

O Fundo Amazônia foi anunciado durante a Conferência do Clima em Bali (COP 13), em 2007, e criado no ano seguinte. Seus principais doadores são Noruega e Alemanha, com 93% e 6% respectivamente, cujo valor total do apoio soma US$ 1,2 bilhão (R$ 4,6 bilhões). Desde a sua criação em 2008, já foram desembolsados R$ 954 milhões, em cem projetos em todo o bioma amazônico.

O recurso é gerido pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) e aplicado em monitoramento, gestão de florestas públicas e recuperação de áreas desmatadas. “O BNDES  foi escolhido para ser o gestor do Fundo dada à sua experiência de corpo técnico capacitado e blindado a alterações políticas”, explicou a chefe do Fundo no BNDES, Juliana Santiago.

Os pilares que regem o trabalho do Fundo se baseiam no pagamento por resultado e na construção de uma governança participativa “em que este seria um fundo público, na sua essência, que captaria esses recursos por resultados de um esforço combinado”, disse Santiago.

Novo fôlego do governo

Adriana Ramos em entrevista a ((o))eco, em abril de 2017. Foto: Márcio Isensee/Arquivo.

Na avaliação do ministro do Meio Ambiente, Edson Duarte, que assumiu a pasta após a saída de José Sarney Filho em abril deste ano, há muito o que comemorar nestes últimos dez anos de Fundo. Ele se diz satisfeito com os resultados e com a forma como os recursos têm sido aplicados.

“O perfil dos beneficiados é amplo e diverso. Temos que comemorar pela experiência e evolução deste grande fundo, com grandes aplicações e uma série de conquistas e plataformas que estão ajudando no comando e controle do desmatamento e na promoção de uma política positiva de desenvolvimento econômico que mantém a floresta em pé”, disse a ((o))eco.

Duarte esteve no fórum em Oslo e reafirmou que a Noruega manterá seu compromisso de cooperação com o Brasil. “Nossa tolerância é zero contra o desmatamento, nossa luta é uma guerra contra o crime organizado que promove o desmatamento ilegal na Amazônia”, insistiu.

Há um ano, quando o presidente Michel Temer esteve em viagem à Escandinávia, o governo norueguês anunciou que iria reexaminar a liberação de recursos ao Fundo em razão de um aumento no desmatamento.

Após uma queda de 15% em 2014, a taxa de desmatamento na Amazônia anual subiu em 24% em 2015; e, em seguida, 29%, em 2016. Quase 8 mil km² foram desmatados em 2016, o pior índice desde o ano de criação do Fundo. Esses números geraram um problema político quando o país escandinavo comunicou que estudava cortar pela metade seus repasses.

Segundo as regras do Fundo, o apoio internacional aumentaria caso os resultados fossem crescentes. Se houvesse um retrocesso nos números do desmatamento, o repasse também cairia.

Ministro do Meio Ambiente do Brasil, Edson Duarte. Crédito: Cortesia Norad.

Segundo Santiago, a lógica do fundo foi construída sob a ideia de que, ao longo do tempo, os resultados serão alcançados e, “aos poucos, vão sendo menores as contribuições”.

Em 2016, “de fato, tivemos o aumento do desmatamento em relação a 2015, mas a taxa não aumentou na mesma proporção da redução da doação da Noruega”. Ela explicou que a comparação dos números de desmatamento de 2015 com a média do período de dez anos (2005-2015) resultou numa “variação de desmatamento evitado menor”.

Em conversa com jornalistas, o ministro do ambiente norueguês, Ola Elvestuen, foi taxativo: “Primeiro, vocês têm resultados, depois vocês conseguem o nosso apoio”.

Na sua opinião, frear o desmatamento tem uma relação estreita com a regulação, promoção de incentivos e aplicação da lei. “Há porções na Amazônia que ainda são terra de ninguém”, disse Elvestuen.

“Nos últimos dois anos, os números do desmatamento indicaram que os resultados estavam indo na direção errada, mas neste ano, parece que poderão retomar a direção correta. Nós, então, vamos pagar de acordo”.

Elvestuen fez questão de destacar que considera a criação do Fundo um sucesso e garantiu que o país manterá seu apoio até 2020. “Nós tínhamos a vontade política de contribuir para frear a devastação e surgiu o Fundo com esta ideia que casa o pagamento baseado em redução do desmatamento. Desde 2008, já transferimos mais de 1,1 bilhão de dólares que ajudaram 96 territórios indígenas, uma área maior que a Alemanha, além de centenas de parques nacionais”.

O motivo que fez Elvestuen garantir o apoio da Noruega ao Fundo por mais alguns anos foi indicado pela queda de 12% no desmatamento em 2017. Na opinião de Edson Duarte, desta vez, o Brasil conseguiu recuperar uma imagem mais positiva e convencer seu principal parceiro e doador a continuar com o apoio.

Ola Elvestuen, ministro de Clima e Ambiente da Noruega. Crédito: Cortesia Norad.

“Entre os países em desenvolvimento, o Brasil foi o que mais diminuiu emissões de gases de efeito estufa em números que são impressionantes. Reduzimos a curva do desmatamento da Amazônia porque estamos aperfeiçoando os sistemas de comando, controle e monitoramento com informações precisas por satélites e cruzamento com bancos de dados como o Cadastro Ambiental Rural, que revelou a fotografia da propriedade rural com mais de cinco milhões de imóveis”, argumentou o ministro.

Ramos, por sua vez, vê com críticas o entusiasmo mostrado pelo governo brasileiro no exterior. Este é um “cacoete” dos governos no Brasil, ironizou, pois “não assumem os problemas”.

“Internacionalmente, [o governo] tem a preocupação de não demonstrar fragilidade e não dar espaço para cobrança”, afirmou. Ramos ressalta ainda que apesar de o Fundo ter avançado e aprimorado os níveis de transparência e acessibilidade para apoiar projetos locais e fortalecer modelos produtivos sustentáveis de conservação, boa parte do portfólio do Fundo ainda concentra projetos de governos. “O que acaba fazendo com que não consiga ser um fundo de inovação”.

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